O que adicionar a uma estatina quando necessário?
O que adicionar a uma estatina quando necessário?
As estatinas, por sua capacidade de melhorar o
Quanto aos fibratos, o estudo ACCORD (Action to
perfil lipídico e reduzir o risco cardiovascular, são os
Control Cardiovascular Risk in Diabetes) avaliou a as-
medicamentos mais prescritos mundialmente para di-
sociação de fenofibrate com estatina e não mostrou
minuir as taxas séricas de colesterol e prevenir even-
significância no objetivo primário. Apenas quando se
tos e mortes cardiovasculares. Entretanto, há algumas
avaliaram os pacientes que apresentavam triglicérides
situações em que elas não são suficientes, mesmo em
aumentados (> 204 mg/dL) e HDL-colesterol baixo (<
altas doses, para obtenção de uma ou mais metas do
34 mg/dL), pode-se constatar benefício significativo
perfil lipídico propostas pelas diretrizes (LDL-coleste-
na redução de eventos cardiovasculares.
rol, triglicérides e HDL-colesterol). Outras vezes, altas
Mais recentemente, a niacina foi testada em asso-
doses não são toleradas, de forma que as metas não
ciação com estatinas em dois estudos. O AIM-HIGH
(The Atherothrombosis Intervention in Metabolic syn-
Existem outros fármacos, com diferentes mecanis-
drome with low HDL/high triglycerides: Impact on
mos de ação, que podem ser associados às estatinas
Global Health outcomes) randomizou para tratamen-
na tentativa de melhorar o perfil lipídico e obter as
to com estatina isoladamente ou em associação com
metas desejadas. São eles: resinas, ezetimiba, fibra-
niacina, portadores de doença cardiovascular com
tos, niacina e ácidos graxos ômega-3 (óleos de pei-
perfil lipídico com boa indicação para esse tratamen-
xe). Entretanto, até o momento, os estudos não têm
to: pacientes com triglicérides elevados e HDL-coles-
conseguido mostrar que a adição de algum produto a
terol baixo. O estudo foi interrompido precocemente
uma estatina, com melhora do perfil lipídico, é capaz
por falta de benefício. Algumas críticas foram lança-
de reduzir o risco cardiovascular. Os estudos publica-
das na tentativa de esclarecer porque o estudo não
dos até o momento que testaram essas possibilida-
mostrou benefício da associação com niacina: baixo
des resultaram negativos e entre as várias razões para
poder estatístico (a população envolvida foi pequena
isso está o mau delineamento de vários deles.
para a diferença encontrada no perfil lipídico com a
Assim, os estudos que avaliaram a associação niacina), o grupo placebo tomou uma dose baixa de
de ezetimiba com a sinvastatina, como o ENHANCE
niacina, para que os efeitos colaterais desse produ-
(Ezetimibe and Simvastatin in Hypercholesterole-
to (particularmente o “flushing”) não denunciasse os
mia Enhances Atherosclerosis Regression) e o SEAS
que tomavam sua dose plena e essa baixa dosagem
(Simvastatin and Ezetimibe in Aortic Stenosis), não
pode ter contribuído para a discreta diferença do perfil
mostraram melhora do risco cardiovascular com a as-
sociação, apesar da maior redução de LDL-colesterol
Recentemente foi apresentado no Congresso do
observada com essa terapia. Ambos os estudos sofre-
American College of Cardiology, mas ainda não publi-
ram importantes críticas sobre os métodos e popula-
cado, o estudo HPS-2 (Heart Protection Study-2) THRI-
VE. Este estudo envolveu a comparação da sinvastati-
na isolada contra esta estatina em associação com
lhora do perfil lipídico dos pacientes (não houve
a niacina associada ao laropipranto, produto que
qualquer redução do LDL-colesterol no grupo que
tinha como proposta diminuir o “flushing” induzi-
tomou óleo de peixe associado à estatina).
do pela niacina. Novamente os resultados foram
Diante desses resultados, continuamos sem
negativos e a grande crítica a este estudo foi que
evidências de que a adição de algum fármaco
os pacientes randomizados apresentavam-se nas
a uma estatina seja capaz de levar à redução de
metas do perfil lipídico: média de LDL-colesterol
eventos cardiovasculares. No entanto, diante das
= 63 mg/dL, média de HDL-colesterol = 44 mg/dL
críticas que cada estudo trouxe consigo e sabendo
e média de triglicérides = 125 mg/dL. Na prática,
dos malefícios proporcionados pelo LDL-coleste-
os pacientes incluídos nesse estudo não tinham
rol aumentado e/ou o HDL-colesterol baixo, con-
qualquer indicação de associação de fármaco sideramos que quando a estatina não é suficiente à estatina que tomavam, uma vez que seu perfil
para trazer o perfil lipídico para as metas recomen-
lipídico já estava nas metas preconizadas. Esse
dadas, esses outros produtos podem ser adiciona-
estudo, além de não constatar benefício da asso-
dos a ela na tentativa de melhorar o perfil lipídico e
ciação, mostrou efeitos colaterais até então nunca
proporcionar maior proteção cardiovascular.
descritos para a niacina, como eventos hemorrági-cos (mais AVCs hemorrágicos) e maior número de
Leitura Recomendada
infecções. Passou-se a discutir se o laropipranto, tido até então como desprovido de efeitos colate-
1. Boden WE; AIM-HIGH Investigators. Niacin in patients
rais, apenas capaz de reduzir o “flushing” induzido
with low HDL cholesterol levels receiving intensive sta-
pela niacina, não teria sido responsável por esse
tin therapy. N Engl J Med. 2011; 365(24):2255-67.
2. Ginsberg HN; ACCORD Study Group. Effects of combi-
pior perfil de efeitos colaterais observado no gru-
nation lipid therapy in type 2 diabetes mellitus. N Engl
po que tomou a associação. Diante desse resulta-
do, a associação da niacina com o laropipranto foi
3. Kastelein JJ; ENHANCE Investigators. Simvastatin
with or without ezetimibe in familial hypercholesterol-
Quanto aos ácidos graxos ômega-3, existe ape-
emia. N Engl J Med. 2008; 358(14):1431-43.
4. Rossebo AB; SEAS Investigators. Intensive lipid lower-
nas um estudo realizado no Japão, o JELIS (Japan
ing with simvastatin and ezetimibe in aortic stenosis. N
EPA Lipid Intervention Study) com pacientes de
alto risco cardiovascular, nos quais, a associação
5. Yokoyama M; JELIS Investigators. Effects of eicos-
de óleo de peixe a uma estatina reduziu de forma
apentaenoic acid on major coronary events in hy-
discreta, mas significativa os eventos cardiovas-
percholesterolaemic patients (JELIS): a randomised
open-label, blinded endpoint analysis. Lancet. 2007;
culares, apesar de não ter levado a qualquer me-
Este material é complementar ao Manual de Cardiologia, dos autores Ari Timerman, Marcelo Bertolami e João Fernando
Monteiro Ferreira, e não pode ser reproduzido, distribuído ou comercializado.
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