PrevenÇÃo e tratamento da contratura capsular apÓs implantaÇÃo
PREVENÇÃO E TRATAMENTO DA CONTRATURA CAPSULAR APÓS IMPLANTAÇÃO DE PRÓTESE MAMÁRIA
Marco Aurélio Guidugli dos Santos, MD 1, 2; Ricardo Frota Boggio, Ph.D 1, 2.;
Elisa Motoka 1, Adolfo Ribeiro Carlucci, MD 1, 2.
1 - Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino-IBRAPE, São Paulo, Brasil.
2 - Serviço de Cirurgia Plástica Oswaldo Cruz, São Paulo, Brasil
Autor: Marco Aurélio Guidugli dos Santos, MD.
Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino-IBRAPE
Av. Brigadeiro Luiz Antônio, 3005, casa 06
Introdução
A contratura capsular é definida como uma cicatrização esférica,
secundária contração da cápsula que envolve a prótese, resultando em uma
mama endurecida, distorcida e, em alguns casos, dolorosa. Muitos fatores
locais estão envolvidos na sua produção, como uma resposta inflamatória
exacerbada e/ou prolongada, trauma, hematoma, infecção, vazamento de
silicone da prótese, entre outros fatores ainda desconhecidos (BECKER, 1999,
Uma vez evidenciada a contratura capsular, a mesma é estadiada em
graus, que variam de I a IV (BAKER, 1981). Seu diagnóstico é eminentemente
clínico, no entanto, exames de imagem como ultra-som, tomografia
computadorizada e ressonância magnética podem colaborar no diagnóstico.
Algumas medidas são consideradas importantes na prevenção da
contratura capsular, como o uso de antibióticos sistêmicos peri-operatórios, a
hemostasia rigorosa, a instilação na loja da prótese de esteróides ou
antibióticos, uso de próteses texturizadas (TARPILA, 1997), a implantação da
prótese em plano sub-peitoral, o uso de dreno de sucção, a massagem da
De acordo com a gravidade da contratura e com a experiência da equipe
assistente, estabelece-se o protocolo a ser utilizado no tratamento da
contratura capsular, que pode ser cirúrgico (capsulotomia ou capsulectomia,
com reposicionamento da prótese), farmacológico (como instilação
intracapsular de esteróides), ou ainda, a partir da utilização de métodos como a
ultra-sonografia e acupuntura, entre outros, todos com variadas taxas de
Os antagonistas dos receptores de leucotrienos, como o zafirlucaste,
são medicamentos usados para o tratamento da asma. Estudos anteriores
mostraram que o zafirlucaste foi eficaz no tratamento de contratura capsular
após implantação de prótese mamária (REID, 2005; SCHLESINGER, 2002).
Sua eficácia foi atribuída à inibição dos leucotrienos (LTC4, LTD4 e LTE4) e
provável efeito supressor nos miofibroblastos. Estas células estão,
presumivelmente, relacionadas com o surgimento de contratura (BAKER,
1981), as fases de proliferação dos fibroblastos e a deposição de colágeno são
exageradas nos casos de contratura capsular. O zafirlucaste é, geralmente,
bem tolerado, entre seus efeitos colaterais possíveis estão dor de cabeça,
náusea e, raramente, hepatopatia, inclusive insuficiência hepática
O objetivo do presente trabalho foi elaborar um protocolo de prevenção e
tratamento da contratura capsular, após inclusão de próteses mamárias, a
partir da associação de tratamentos clínicos e cirúrgicos. Material e Método
O presente estudo foi desenvolvido pelo Serviço de Cirurgia Plástica
Oswaldo Cruz-SCPOC e pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino-
IBRAPE, entre janeiro de 2007 e dezembro de 2008. Neste período 119
pacientes foram submetidas à mamoplastia de aumento, sendo que, em 21
casos, associou-se a mastopexia. Das pacientes operadas, 4 apresentavam
contratura capsular prévia, tendo sido a inclusão primária das próteses
realizada em outros serviços, e 5 evoluíram com contratura capsular após
Para avaliação do grau de contratura capsular foi utilizada a
classificação de Baker, a qual estadia a contratura em graus variando de I a IV:
• Grau I – a mama apresenta consistência semelhante a de uma mama
• Grau II – contratura mínima - a mama encontra-se um pouco mais
endurecida, quando comparada a mama normal, sendo a prótese
• Grau III – contratura moderada - a mama encontra-se mais endurecida,
a prótese pode ser facilmente palpada e sua distorção visível;
• Grau IV – contratura grave - a mama encontra-se bem endurecida, com
importante distorção de sua anatomia, sendo ainda, dolorosa e fria.
As pacientes com contratura capsular Baker II foram submetidas a
tratamento clínico, a partir da associação de microcorrente (MENS), ultra-som
(US) e drenagem linfática manual (DLM).
A microcorrente (MENS), na função de normalização, consiste em ondas
suaves, com corrente de intensidade em torno de 40 mA e freqüências que
variam de 0,3 a 0,7 Hz. A microcorrente é capaz de promover a otimização da
fisiologia celular, proporcionando maior oferta de ATP à mitocôndria, além de
estimular o incremento da microcirculação.
O US, na potência de 0,8 a 1,2 W/cm2, em modo pulsado (50%), quando
utilizado durante 20 minutos, sendo 10 minutos em cada mama (5 minutos em
cada quadrante), exerce importante efeito fibrinolítico, colaborando para o
relaxamento da cápsula em formação.
Após a aplicação da MENS e do US, as pacientes foram submetidas a
drenagem linfática manual (DLM) com a intenção de se promover a
mobilização de líquidos e conseqüente redução do edema, além de contribuir
na melhoria da circulação local. Na DLM, todo o contingente linfático deve ser
direcionado para os linfonodos axilares e supra-claviculares de forma lenta e
rítmica. Pode-se realizar as manobras simultaneamente em ambas as mamas,
evitando manipulação da prótese nos primeiros dias de pós-operatório. Deve-
se utilizar um creme ou óleo mineral para melhor deslizamento das manobras,
evitando assim, tracionar a pele, principalmente próximo às suturas. A DLM,
além de aumentar a reabsorção do edema, é um método relaxante e
Este protocolo foi realizado 2 vezes por semana até a redução da
contratura de Baker II para I, sendo então, iniciado programa de manutenção,
com repetições do protocolo a cada 15 dias, por até 3 meses após a redução
Nos casos de contratura grau III e IV de Baker, optou-se pela troca da
prótese mamária, com reposicionamento da mesma no plano sub-muscular,
associada à capsulotomia ou a capsulectomia, quando necessário. No 3º. dia
de pós-operatório, estas pacientes iniciaram o tratamento clínico, com a
associação da MENS/US/DLM ao uso via oral do Zafirlucaste (Accolate,
AstraZeneca), na dose de 20 mg, de 12/12 horas, por um período de 90 dias. A
MENS/US/DLM foi realizada 2 vezes por semana nos primeiros 30 dias, sendo
após isso, iniciado protocolo de manutenção, com sessões a cada 15 dias até o
Resultados
No período de janeiro de 2007 a dezembro de 2008, 119 pacientes
foram submetidas a mamoplastia de aumento no Serviço de Cirurgia Plástica
Oswaldo Cruz-SCPOC / Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino-IBRAPE.
Em 21 dos 119 casos operados, o que equivale a 18% das cirurgias
realizadas, associou-se à inclusão da prótese mamária a mastopexia. As
cicatrizes resultantes da mastopexia foram em 7 casos (6%) periareolar, em 4
(3%) periareolar + vertical e em 10 (8%) em “T” ou mini “T” invertido.
A via de acesso preferencial para inclusão da prótese foi o sulco
inframamário (80% casos). A via periareolar foi utilizada em 17% dos casos e a
axilar em 3% das pacientes operadas.
Em 76% das pacientes submetidas a cirurgia (91 casos), a prótese
mamária foi implantada no plano subglandular e em 24% dos casos no plano
As próteses utilizadas, na sua totalidade, foram próteses de gel coesivo,
redondas, de perfil alto, texturizadas, com volume médio de 280cc (220-375).
As cirurgias foram todas realizadas em ambiente hospitalar, sendo
utilizada como técnica anestésica sedação associada à peridural.
Das 119 pacientes operadas, 4 (3%) apresentavam contratura capsular
prévia, tendo sido a prótese primária implantada em outros serviços, e 5 (4%)
evoluíram com contratura capsular após terem prótese mamária implantada
pelo Serviço de Cirurgia Plástica Oswaldo Cruz. Dos 9 casos de contratura
capsular 3 foram classificados como Baker II, 5 como Baker III e 1 como Baker
Figura 1 – Contratura capsular Baker IV
As pacientes com contratura Baker II foram submetidas apenas ao
tratamento clínico, sem o uso do zafirlucaste, e as pacientes com contratura
Baker III (Fig. 2) e IV tiveram suas próteses substituídas, sendo posteriormente
submetidas ao tratamento clínico associado o uso do zafirlucaste. Oito (89%)
das pacientes tratadas evoluíram com resolução completa da contratura,
retornando a Baker I e 1 (11%) paciente apresentou redução do grau de
contratura passando de Baker III para Baker II, mesmo após ter sido submetida
Figura 2 – Paciente no pré-operatório com contratura Baker III e após tratamento (cirurgia +
tratamento clínico), retornando a Baker I
As pacientes foram seguidas em média durante 11,2 meses (3 a 18
meses). Nenhuma paciente apresentou efeitos colaterais ao tratamento clínico
ou complicações após o procedimento cirúrgico. Discussão
A contratura capsular é a complicação mais comum da mamoplastia de
aumento, sendo que, sua incidência varia entre 0,5 e 30% (MATHES, 2006).
No presente trabalho encontramos uma incidência de contratura capsular de
4%, a qual está em concordância com a literatura.
A causa da contratura parece ser multifatorial, no entanto, acredita-se
que os principais fatores envolvidos sejam o incremento do processo
inflamatório, infecções sub-clínicas e a proliferação celular aumentada,
associada a presença de miofibroblastos (BECKER, 1999, BASTOS 2007).
Os miofibroblastos são células especializadas, derivadas dos
fibroblastos, pericitos, células musculares lisas e de algumas células do
estroma, que apresentam características contráteis. Os três elementos
essenciais que definem o miofibroblasto são: a presença de fibras de estresse
(α-actina), sítio de ligação estroma-célula bem desenvolvidos (fibronexus) e
junções comunicantes e intercelulares bem definidas (DARBY, 1990,
ALBERTS, 2004). Acredita-se que, na contratura capsular, ocorra um aumento
na atividade dos miofibroblastos, presentes nas paredes da cápsula,
favorecendo, desta maneira, a instalação e progressão da contratura.
Tendo-se o conhecimento das principais causas envolvidas na
patogênese da contratura capsular, a elaboração de protocolos que possam
prevenir e tratar a contratura capsular são de grande importância.
A microcorrente, consiste em um estímulo elétrico subsensorial, capaz
de promover a otimização da fisiologia celular, proporcionando maior oferta de
ATP (adenosina trifosfato) à mitocôndria, além de estimular o incremento da
microcirculação (neoangiogenese), a redução do edema e o equilíbrio na
produção da matriz extracelular. É possível que, sua aplicação junto à cápsula,
proporcione condições para a formação de um tecido de granulação mais
eutrófico, com menor tendência de hipertrofia (espessamento) e contração.
O ultra-som, utilizado no modo pulsado, atua reduzindo o nível de
células inflamatórias e a proliferação de fibroblastos, além de exercer
importante efeito fibrinolítico. Sua aplicação, desta maneira, acaba por
proporcionar condições para a formação de uma cápsula mais relaxada, de
menor espessura e capacidade de contração.
A drenagem linfática manual promove o descongestionamento dos
gânglios da cadeia axilar central e peitoral, que se encontram no cavo axilar e
bordo lateral do músculo peitoral maior, do grupo de gânglios que se
encontram medialmente, seguindo a cadeia mamária interna, e dos gânglios
subclaviculares, que recolhem a linfa dos vasos peitorais anteriores. A DLM,
além de reduzir o edema, aumenta a circulação arterial e, conseqüentemente,
a pressão parcial de oxigênio, proporcionando, desta maneira, condições para
a ocorrência de uma cicatrização não patológica.
O real mecanismo de ação dos antagonistas dos receptores de
leucotrienos (Zafirlucaste) na redução e prevenção da contratura capsular
ainda não está totalmente estabelecido, porém, existem evidências clínicas da
melhora da contratura capsular com o seu uso.
Muitos autores têm descrito menores incidências de contratura capsular
após a implantação da prótese em plano sub-muscular. Nos casos de
contratura, o reposicionamento da prótese para o plano sub-peitoral, associado
a capsulotomia e, nos casos em que a cápsula se encontra muito espessada,
deformando de maneira significativa a anatomia mamária, associado a
capsulectomia, tem colaborado na redução das recidivas.
A associação da microcorrente com o ultra-som e a drenagem linfática
manual, como proposta no presente trabalho, tem-se mostrado eficaz no
tratamento da contratura Baker II. Nos casos de contratura Baker III e IV, a
opção tem sido a troca da prótese, com reposicionamento para o plano
submuscular, com posterior realização da microcorrente, do ultra-som e da
drenagem linfática manual, iniciados no 3º. dia de pós-operatório. A estes
casos, a associação do uso via oral do zafirlucaste tem proporcionado
Os bons resultados obtidos com o protocolo proposto, encorajou-nos a
realizar a execução da microcorrente, do ultra-som e da DLM, de maneira
preventiva, em todas pacientes submetidas a implantação de prótese de
silicone, a partir do 3º. dia de pós-operatório. Após o início do protocolo
preventivo, há cerca de 6 meses, não observamos mais nenhum caso de
contratura, o que em muito, tem estimulado a continuação do trabalho. Conclusão
Por ser a complicação mais freqüente, após a implantação de próteses
mamárias, gerando importante grau de insatisfação ao paciente e ao médico
assistente, a prevenção e tratamento da contratura capsular tem sido motivo de
freqüentes discussões e pesquisas.
A associação da microcorrente ao ultra-som e a drenagem linfática
manual tem se mostrado como importante ferramenta na prevenção da
contratura capsular, após a implantação de prótese mamária. Esta associação,
complementada pelo reposicionamento da prótese no plano submuscular e
pela utilização do zafirlucaste, nos casos de contratura capsular Baker III e IV,
tem sido determinante no tratamento da contratura.
É extremamente importante, em uma programação cirúrgica, a
participação ativa de uma equipe multidisciplinar formada por esteticistas,
fisioterapeutas e médicos especializados, no pré e pós-operatório das
pacientes a serem submetidas a implantação de próteses de silicone,
favorecendo assim, a obtenção de melhores resultados, livres de
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